sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Como as emoções afetam a percepção do consumidor

Em setembro de 2009 o Journal of Consumer Research publicou um estudo dos pesquisadores Anastasiya Pocheptsova and Nathan Novemsky que revela que o estado emocional vivido por uma pessoa num dado momento afeta a maneira como ela percebe os estímulos à sua volta. Ou seja, como avalia um filme, uma propaganda ou um restaurante e isto, sem dúvida, teria implicações para publicitários e profissionais de marketing.

Se, por exemplo, você está triste e assiste a um filme nesse "mood" [triste] sua opinião tenderá a ser influenciada pelo seu estado emocional e, mais ainda, o ato de falar sobre o filme enquanto você estiver nesse estado emocional poderá travar essa emoção (lock-in) e influenciar permanentemente sua opinião sobre tal filme.

Para testar como o estado emocional atual afeta percepções os pesquisadores pediram a cerca de 100 sujeitos que observassem um quadro do pintor Cezanne (selecionaram apenas sujeitos que não possuiam réplicas dessa obra). Metade dos sujeitos leram um texto de conteúdo triste e depressivo,enquanto a outra metade não o leu. Em cada grupo alguns sujeitos eram solicitados a opinar imediatamente sobre o quadro e os demais apenas cinco dias depois.
De maneira geral, os sujeitos que leram o texto e comentaram sobre o quadro imediatamente fizeram avaliações mais negativas do que os sujeitos que não leram o texto. Além disso, entre os sujeitos do grupo que avaliou o quadro em estado emocional negativo os que deram opiniões imediatamente tenderam a fazer avaliações mais negativas do que aqueles que o avaliaram cinco dias depois.

Estes achados levaram os pesquisadores a concluir que estados emocionais eventuais têm efeito na percepção das pessoas, porém um efeito limitado ao longo do tempo. Em outras palavras, as emoções afetam a percepção, mas principalmente as percepções que ocorrem concomitantemente ao evento ou imediatamente após a ocorrência do estado emocional. Ou seja, o efeito da emoção sobre a percepção é declinante ao longo do tempo. Exceto se junto ao estado emocional a percepção for expressa de um modo mais formal - uma avaliação, a verbalização de uma opinião etc. Nestes casos ocorreria o fenomeno "lock-in", onde a influência das emoções na percepção tenderiam a se fixar.

As informações obtidas nesse estudo são particularmente relevantes aos publicitários. Os autores argumentam que seria interessante que os consumidores sejam encorajados a avaliar um produto logo após assistirem anúncios com mensagens positivos e até sugerem a inclusão de um espaço para avaliação do produto no próprio anúncio. Nesse acaso a percepção positiva do produto teria um efeito durador na memória do consumidor e poderia influir nas escolhas futuras deste. A avaliação positiva do produto naquela circunstância estaria fixada ou travada [locked-in] na memória do consumidor em razão do emparelhamento com as emoções positivas eliciadas pelo anúncio.

Nesse sentido os pesquisadores recomendam que se evite criar uma mensagem publicitária que relembrem aos consumidores ocasiões em que tenham usado o produto no passado. Embora esta seja uma estratégia comum, na verdade ela poderia reduzir a influência de um anúncio ao deslocar a percepção do produto para um evento do passado, o que poderia despertar memórias negativas.

Resumindo, as emoções do consumidor desempenham um papel relevante nas suas impressões sobre um serviço, produto ou propaganda. Porém, o efeito da emoção tende a se dissipar, a menos que ele seja travado (lock-in) num momento específico.

Pocheptsova, Anastasiya and Nathan Novemsky (2010) “ When Do Incidental Mood Effects Last ? Lay Beliefs versus Actual Effects”. Journal of Consumer Research, vol 36. Para acessar o texto clique aqui.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O risco de confiar somente em dados coletados online

Na esteira do grande crescimento do comércio e da publicidade online (1) as grandes empresas estão investindo pesado em técnicas analíticas voltadas para explorar o potencial de informações que residem no meio digital. Entre as tecnologias empregadas estão os já conhecidos programas de CRM (customer relationship management) e outras ferramentas mais recentes e ainda experimentais como a web analitics, Data Mining e a social media analitics etc. O objetivo é derivar o máximo de informações sobre o consumidor e seus hábitos de compra, para isso utilizando todos os recursos da internet.

Porém, sem pretender estragar a festa de ninguém nem colocar água na fervura, um recente estudo publicado por três professores de marketing de universidades americanas - Amit Poddar, Jill Mosteller e Pam Scholder Ellen - revela alguns achados que contradizem o atual frenesi de marketeiros e pesquisadores de mercado em torno das "novas ferramentas analíticas"(2).

Segundo o estudo, quanto mais dados uma empresa solicita de clientes que visitam seu website, maior a tendência deles se tornarem mais reticentes em compartilhar informações pessoais. Aliás, qualquer um que tenha uma relativa experiência com a internet e com e-commerce sabe que não é de todo incomum usuários da internet fornecerem endereços de email fictícios e informações pessoais imprecisas ou mesmo falsas. Especialmente se a empresa que solicita as informações for pouco conhecida.

De acordo com estimativas do site da revista Strategy & Business da consultoria Booz&Co., que menciona o estudo de Poddar e seus colegas (3), as perdas envolvidas na gestão de informações errôneas de consumidores giram em torno de US$ 600 bilhões de dólares por ano, o que equivale a 5% do PIB dos Estados Unidos.
A pesquisa também mostrou que se os consumidores não perceberem benefícios evidentes para fornecerem informações precisas, provavelmente, eles fornecerão dados incompletos ou imprecisos, como forma de retaliar táticas agressivas e pouco confiáveis de data mining de empresas.

Dentre os motivos declarados pelos participantes da pesquisa para sonegar informações solicitadas destacam-se a preocupação com a privacidade e o receio de roubo de dados pessoais. Por outro lado, empresas que se esforçam para construir relacionamentos de longo prazo com seus consumidores fundados na confiança mútua tendem a receber mais informações precisas.

O estudo conduzido por Poddar, Mosteller e Ellen (2009) coloca por terra o discurso deslumbrado de "novidadeiros" de plantão que propõem que as empresas devam adotar com celeridade as assim chamadas "novas técnicas análiticas" como se estas fossem uma panacéia para os males do marketing e da propaganda (ver post anterior) e nem sequer levam em conta a saudável advertência de estudos como o acima mencionado de que dados obtidos via transaçõs online devem ser analisados com cuidado e parcimônia em razão do risco nada despresível da imprecisão e falsidade das informações.

(1) Segundo o Projeto Inter-Meios enquanto o mercado publicitário clássico cresceu 0,67% em 2009, a propaganda online cresceu 21,5% no mesmo período.
(2) Poddar A., Mosteller, J. and Ellen, P.S. Consumers’ Rules of Engagement in Online Information Exchanges. The Journal of Consumer Affairs, Vol. 43, No. 3, 2009. (para acessar clique aqui)
(3) Getting Accurate Information from Online Customers - Strategy & Business November 2009. Clique aqui para acessar o texto.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Tendências de pesquisa para 2010 - estudo NGMR revela contradições

Um levantamento realizado pelo NGMR (1) junto aos seus membros revelou que, de modo geral, os clientes de pesquisa, especialmente as grandes empresas, estariam mais interessadas na utilização de novas ferramentas de pesquisa do que os fornecedores de pesquisa. Por novas ferramentas entenda-se: data mining, Web analytics, CRM e análise de redes sociais. Segundo Tom Anderson, fundador do NGMR, isso indicaria que as empresas fornecedoras de pesquisas de mercado estariam presas ao que ele chamou de pesquisa 1.0. Ou seja, os pesquisadores estariam aprisionados no passado, ou desatualizados. O mesmo Anderson adverte que os fornecedores de pesquisa deveriam estar liderando o processo de adoção de novas ferramentas, mas ao invés disso o que se estaria observando seria as empresas clientes procurando resolver suas "novas necessidades" realizando projetos de pesquisa internos, em outras palavras, na falta de prestadores de serviços os clientes estariam apelando para soluções caseiras.

Porém, um aspecto que parece ter escapado da análise do NGMR é que atualmente nas grandes empresas a maioria dos profissionais são jovens que tendem a ser mais abertos a novidades em geral. Muitas vezes esses profissionais são inexperientes e possuem uma formação bastante precária em termos de metodologia de pesquisa o que também os tornaria presas mais fáceis de modismos nem sempre comprometidos com qualidade na coleta e análise de dados.

O estudo também enfatiza que os clientes não estariam abandonando as técnicas "tradicionais" de pesquisa, mas ampliando o mix de ferramentas disponíveis. Contudo, a análise do NGMR mais uma vez parece perder de vista um aspecto prático: os recursos em geral são finitos e isso vale para os orçamentos de pesquisa. Portanto, se algumas modalidades "novas" de pesquisa irão ganhar verbas, outras inevitavelmente irão perde-las. Pode parecer cruel, mas é a realidade.

Mais uma vez, observo que no debate sobre inovação em pesquisa de marketing um estudo é apresentado de modo "isento", quando na verdade ele está comprometido com um dos lados em questão. O material da NGMR em nenhum momento se dá ao trabalho de discutir a eficácia das novas ferramentas, o que elas têm de potencial real e o que é mera retórica de venda. Isso seria o desejável em um estudo, digamos, neutro. Mas, o caso não parece ser este.

Quem tiver interesse em conhecer uma apresetação com resultados do estudo clique aqui

(1) O NGMR (Next Generation Market Research) é um grupo ou rede de profissionais de pesquisa de marketing - tanto fornecedores como clientes - cujo interesse seria explorar e difundir pelo mercado novas técnicas de pesquisa, a saber data mining, Web analytics, CRM analytics, social network analysis and blog mining

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

O valor de um bom recrutamento

São muitas as etapas que constituem uma pesquisa qualitativa de mercado e entre elas o recrutamento dos sujeitos é uma fase importante, mas que nem sempre tem seu valor reconhecido.

Como pesquisadora qualitativa já perdi a conta de quantas vezes ouvi comentários de profissionais da área sobre a menor importância do recrutamento frente as etapas de coleta e, principalmente, análise dos dados. Para alguns, recrutamento parece ser visto como atividade menor, que não exige qualificação. Grande equívoco!
Quero comentar algumas situações que mostraram na prática a contribuição do processo de recrutamento para reestruturar características da amostra previamente desenhadas e também como mostrou-se uma fonte de informações relevantes que enriqueceram processos de pesquisa qualitativa.

Descoberta de informações desconhecidas
Durante uma pesquisa numa cidade do interior de São Paulo fomos a campo com uma amostra previamente estruturada de acordo com informações e demandas da empresa cliente. Tinhamos como objetivo recrutar para discussões em grupo clientes de uma rede de supermercados e seus concorrentes. Pois bem, durante o recrutamento pudemos levantar que uma rede de lojas que havia sido desconsiderada pela empresa cliente foi mencionado pelos sujeitos como sendo uma opção de compra ainda mais considerada do que os concorrentes que o cliente acreditava serem os mais significativos. Resultado: levamos essa informação ao cliente e reestruturamos a amostra, incluíndo clientes dessa rede para ouvirmos suas opiniões.
Numa outra pesquisa com consumidoras de um produto cosmético recebemos a informação da empresa cliente de que esse produto era pouco consumido na classe social C e portanto deveríamos concentrar esforços no recrutamento de classes A e B. No processo de recrutamento pudemos identificar que o consumo desse produto era bastante frequente entre indivíduos de classe C e sugerimos ao cliente incluir grupos com indivíduos dessa classe para conhecermos suas opiniões.

Boa formação e iniciativa
Tinhamos que reunir um grupo de proprietários de automóveis de luxo que, segundo critérios de classificação social, pertenceriam a classe A com as mais altas pontuações. Recebemos um sujeito que tinha o automóvel exigido para participar da pesquisa, mas que seria desconsiderado por ter sido classificado como pertencente à classe social B. O profissional de recrutamento teve o cuidado de sondar mais aspectos de estilo de vida do sujeito e descobriu tratar-se de um profissional liberal que vivia num flat sem muitos banheiros, freezer, rádios, microondas, empregados mensalistas, etc, mas possuia um estilo de vida tão ou mais sofisticado que os demais participantes. A iniciativa do recrutador foi definitiva para termos um participante com características de perfil compatíveis ao projeto.

Portanto algumas considerações são importantes:

  • Recrutamento barato é recrutamento sem qualidade – busque profissionais qualificados para a execução do trabalho. Não dê crédito à mão de obra barata, pessoas desempregadas que estão “fazendo um bico” enquanto não encontram nada melhor para fazer. Lembre-se de que “você recebe pelo que paga”;
  • Forneça informações detalhadas ao recrutamento – elaborare instruções detalhadas para os executores do recrutamento. Não esconda informações importantes em nome do sigilo, pois estas podem comprometer a busca de sujeitos com perfil adequado;
  • Acompanhar é preciso – o trabalho deve ser acompanhado em toda sua extensão pois podem surgir informações importantes que podem dar ao pesquisador dicas preciosas para rever e reestruturar a amostra.
  • Mantenha o canal aberto com o cliente de pesquisa – muitas vezes o cliente tem informações preconcebidas, equivocadas e até preconceituosas sobre seu mercado. Ajude-o a compreender que o processo de pesquisa qualitativa é dinâmico e admite ser reestruturado durante o processo. Isso não é uma falha nem fraqueza da metodologia qualitativa, mas uma de suas características mais valiosas.