terça-feira, 9 de março de 2010

Os quarenta são os novos vinte

O canal Sony usou o bordão acima para apresentar a nova comédia Cougar Town dedicada a tratar do universo feminino em formato de comédia.
Cougar Town conta a história de uma mulher que chega aos 40 anos e se defronta com uma dura realidade - o tempo passou e a implacável ação da natureza não a fez assim tão bela, vigorosa e sedutora como aos 20 anos. Envolta em situações relativamente bem humoradas, mas que beiram o sarcásmo, a protagonista tenta ao longo dos episódios empreender uma jornada em busca do tempo perdido, viver o que não pode aos 20 anos pois casou-se nova, logo teve um filho e, hoje, apesar de profissional bem sucedida, está divorciada e sozinha. Ela se esforça para acompanhar o ritmo das amigas na casa dos 20 anos, mas percebe-se em situações constrangedoras como, por exemplo, enfrentar o “efeito dia seguinte”: descobre-se sem a mesma resistência física e disposição para beber, dançar, ficar a noite toda acordada e seguir direto para um dia cansativo de trabalho. Enfrenta a ressaca, desaba, mas persiste. Ainda assim, vive momentos de crise e parcial lucidez quando reflete com sua vizinha, também com 40 anos, sobre seus comportamentos pouco adequados à idade ou quando se sente desajustada no relacionamento com homens bem mais jovens.
A trama de Cougar Town assim como de “The New Adventures of Old Cristine”, “Lipstick Jungle” e a consagrada “Sex and The City” – denotam um fenômeno que se acentua e se perpetua nas sociedades ocidentais: mulheres querem permanecer jovens. Não se trata apenas de querer ter melhor qualidade de vida, ser saudável e chegar aos 40 com vigor e integridade física, mas sim de aparentar ser uma jovem de 20 anos, custe o que custar.
Mulheres acima dos 30 anos podem ser vistas em lojas de departamentos consumindo roupas e acessórios nas seções destinadas às “teens”. Mulheres maduras gastam o tempo e, muitas vezes, o dinheiro que não têm para esculpir seus corpos com cirurgias plásticas e muita malhação.
Embora a busca da juventude não seja algo inerente somente às mulheres, elas são presas mais fáceis dos apelos à jovialidade, pois são incentivadas desde muito cedo a cultivar a a vaidade, investir na beleza e na sedução. Mulheres são impelidas a buscar a beleza e isso pode resultar em obsessão (1).
Ser jovem tornou-se um valor central em nossa cultura. A produção cultural, bem como os bens de consumo são orientados para esse valor. Crianças abreviam a infância e aceleram a entrada na juventude, assim como adultos investem na desaceleração do envelhecimento para permanecerem jovens por mais tempo. Nossa sociedade instituiu padrões e códigos estéticos e parece cada vez menos tolerante aos desvios desses padrões, apesar da enxurrada de discursos politicamente corretos, presentes inclusive em muitos discursos publicitários - “aceite-se como você é”, “cada um é bonito do seu jeito", “beleza não tem idade” etc.
Ninguém quer ocupar o lugar do “velho”, pois isso significaria assumir-se “fora do jogo”, e o que as mulheres com 40 anos ou mais estão nos dizendo é que aceitaram fazer um “trade-off”. Estão se desafiando em todos os sentidos para cultivar e cultuar um corpo jovem, mostrando que aceitaram os padrões de beleza vigentes para, com isso, garantir aceitação e, com muita sorte, alguma admiração.
O que parece estar acontecendo é que, na busca pelo Santo Graal da juventude, abdica-se da maturidade e dos possíveis benefícios que ela pode trazer tais como maior conhecimento e cultura (no sentido erudito do termo), acúmulo de experiências que podem ajudar a tomar decisões mais acertadas entre outros ganhos decorrentes da vivência adulta. E isso pode indicar o surgimento de pessoas com sérios problemas de identidade que não conseguem se equiparar ao físico dos 20, ao mesmo tempo em que se recusam a ter a maturidade dos 40.

(1) Segundo pesquisa Datafolha realizada para a SBCP são realizadas no Brasil 457 mil cirurgias estéticas e 172 mil reparadoras, sendo que 80% dos pacientes das duas modalidades são do sexo feminino.