sexta-feira, 23 de abril de 2010

Como os bens de luxo podem afetar as pessoas

Recente estudo conduzido pelos Professores Roy Y.J. Chua da Harvard Business School e Xi Zou da London Business School (The Devil Wears Prada? Effects of Exposure to Luxury Goods on Cognition and Decision Making) concluiu que a exposição ao luxo pode exercer um efeito importante na cognição, na maneira como as pessoas se comportam e também influenciar o processo de tomada de decisão (1).


Após a realização de vários experimentos os pesquisadores concluiram que quando pessoas são orientadas a pensar em luxo elas tendem a tomar decisões mais autocentradas do que decisões autruístas. Em outras palavras, quando pensamos em luxo tendemos a focar mais em nós mesmos e em nossos interesses do que em preocupações e necessidades coletivas. Já comentei em um post anterior que o estado emocional vivido num determinado momento afeta a maneira como avaliamos os estímulos que estão à nossa volta. E, ao que parece, as conclusões dos professores Chua e Zou caminham nessa mesma direção, na medida em que “o luxo” configuraria uma atmosfera específica e que afetaria a percepção dos envolvidos.

Num primeiro experimento os participantes (estudantes universitários) imaginado-se no papel de um CEO responderam uma série de perguntas relacionadas a tomada de decisões nos negócios e que foram criadas com objetivo de saber se as pessoas colocariam interesses pessoais ( p. ex: maximizar os lucros para a empresa) acima de interesses coletivos (preservar o meio ambiente). Em uma das etapas foi perguntado aos participantes se eles aprovariam a fabricação de um novo modelo de carro que traria enormes lucros para a empresa, mas que poderia potencialmente poluir o ambiente.

Um detalhe importante é que antes de responderem às questões, metade dos participantes receberam informações de que o tal carro era um modelo de luxo e a outra metade foi informada de que se tratava de um carro comum. Os pesquisadores perceberam que as pessoas orientadas a pensar no carro como um exemplar de luxo apresentaram forte tendência de tomar decisões mais autocentradas (lucros), mas que poderiam prejudicar o ambiente. Já o grupo que partiu da premissa de que o carro seria um modelo mais popular, tendeu a decidir pela não fabricação do modelo.

Os pesquisadores mencionaram ainda os resultados de uma pesquisa de marketing realizada para o lançamento de um perfume, onde também foi possível observar o efeito que o luxo pode causar nas pessoas.

Os sujeitos foram divididos em 2 grupos para testarem o mesmo perfume. O primeiro grupo leu um texto que apresentava perfumes como produtos de luxo. O outro grupo leu outro texto que descrevia perfumes como produtos necessários no dia a dia. Concluiu-se que aqueles orientados para a idéia de perfumes como itens de luxo tenderam a se comportar de maneira auto interessada e mostraram-se menos propensos a dar contribuições para desenvolver o produto pensando em benefícios para as pessoas em geral.

Algumas ressalvas foram feitas pelos pesquisadores. O luxo não induziria necessariamente as pessoas a prejudicarem as outras, mas poderia torná-las menos preocupadas com as outras.

“It´s non sense not science”
O estudo que apresento acima apresenta alguns insights interessantes para se pensar sobre o papel dos bens luxo nas decisões e comportamentos das pessoas. No entanto, o tipo de experimento realizado – com universitários imaginando-se no papel de executivos – é muito frágil e poderia facilmente ser criticado em seus pontos fracos. Mas isso não é o problema mais importante do referido estudo.

Partindo de uma base amostral simples e pouco representativa do universo corporativo, os autores resolveram dar uma lição de moral às grande organizações sugerindo que: “limitar o acesso que executivos têm a bens de luxo pode ser um passo para torná-los mais atentos às necessidades coletivas e mais responsáveis com a sociedade em geral, especialmente em tempos de crise econômica”.

Isso não parece ciência, mas sim um uso pouco cuidadoso de um estudo simples para fazer, tudo indica, militância política em favor de certas idéias muito em voga atualmente nos Estados Unidos. Este tipo de “produção acadêmica”, infelizmente está crescendo, podendo causar sérios estragos na credibilidade dos centros de pesquisa.

Eu hein, Harvard.

(1) Para acessar o paper completo da pesquisa clique aqui,

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Do turismo romântico ao consumo de massa

Ainda hoje quando se fala em viajar seja a trabalho ou lazer uma imagem recorrente é a da aventura, da excitação, da descoberta do novo, do diferente e de se surpreender com experiências inigualáveis. Essa visão idealizada do turismo remonta às primeiras décadas do século 20, quando viajar era acessível a poucos afortunados ou àqueles dotados de espírito aventureiro. Os filmes do personagem Indiana Jones refletem esse universo de referências românticas que inclui a viagem para lugares distantes e exóticos.


Por outro lado, qualquer um que tenha viajado nos últmos 10 ou 15 anos sabe muito bem que a experiência de ser um turista ou viajante já não cabe exatamente nessa moldura idílica da aventura. As longas filas nos aeroportos, hotéis lotados que não correspondem às expectativas, agências de viagens que prometem muito e entregam pouco, destinos turísticos pouco preparados para receber turistas de modo hospitaleiro etc. Enfim, não é de todo incomum que a viagem transforme-se em decepção onde a melhor parte da mesma é o retorno para o “lar-doce-lar”.
Mas o que teria acontecido? Mudaram as experiências ofertadas ou mudaram os viajantes? Provavelmente ambos, então vamos analisar rapidamente cada um deles.

Turismo mundial em dados - a massificação

Segundo dados fornecidos pelo site da World Tourism Organization (WTO) as receitas geradas pelo turismo no mundo alcançaram a marca de US$ 946 bilhões em 2008 . Ainda de acordo com a WTO entre os anos de 1950 e 2005 enquanto a população mundial passou de 2,5 para 6,5 bilhões de habitantes, um crescimento de 260%, o turismo cresceu de 25 milhões de desembarques internacionais em 1950 para algo em torno de 806 milhões em 2005, um crescimento de 3.224%.


Os números acima são hiperlativos e constituem uma evidência gritante de que o turismo tornou-se um produto, ou melhor, um serviço de massa. Ele se popularizou de modo inquestionável. Porém, junto com essa popularização vieram os problemas decorrentes da falta de infraestrutura adequada para atender a uma demanda que tende a crescer a taxas anuais superiores ao crescimento da economia em geral.

Certamente a precariadade da infraestrutura explica uma parte dos desafios enfrentados pelo setor de turismo. Mas existe ainda um outro fator que, tudo indica, impacta profundamente na percepção da qualidade e atratividade dos serviços. Esse fator é o próprio viajante ou turista que carrega sua bagagem cultural e expectativas para suas viagens.

O turista-massa e a experiência de viajar

Na medida em que o turismo se torna acessível à massa é inevitável que as expectativas em relação aos serviços se transformem de acordo com as exigências da maioria. O que era entendido como o objetivo e significado da viagem até a década de 1950, muito provavelmente não vale mais para os dias de hoje.

Podemos dizer que o viajante de cinqüenta anos atrás ou mais estava em busca de conhecer culturas exóticas, diferentes e que caracterizavam países e povos distantes. A diferença e o inesperado não constituiam obstáculo, mas antes eram os atrativos. Daí a idéia de aventura. A busca era por um ganho cultural, ou ainda, pela expansão dos horizontes intelectuais. Claro que as pessoas carregavam para os destinos de viagem seus hábitos culturais. Mas, havia a curiosidade pelo estranho e pelo inusitado.

Atualmente, podemos dizer que o turismo passou por um processo de pasteurização e homogeneização. Onde as diferenças culturais foram burocraticamente eliminadas ou bastante amenizadas. É como comer um Big-Mac - É igual no Brasil, em Cingapura ou no Canadá.

A lógica por detrás dessa equalização decorre do fato de que a maioria das pessoas - ou a massa - não gosta de ser surpreendida. É bastante provável que alguém já tenha lhe dito algo como: “a comida desse ou daquele país é horrível. Eu não via a hora de comer um feijãozinho caseiro”. Assim, o que o turismo perdeu em termos culturais ele ganhou ou procurou compensar como experiência de consumo, no sentido de atender às expectativas do cliente.

Claro que isto não é válido para todo e qualquer turista. Certamente há variações no grau de tolerância às diferenças e no interesse cultural. Da mesma forma que existem diferentes tipos de turistas e viajantes mas, como regra geral, descreve muito bem a maioria dos turistas.

Por fim, podemos dizer que a popularização do serviço resultou em uma redução do conteúdo cultural da experiência do turismo.