quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A perigosa mistura de pesquisa com política

Em face das eleições, pessoas conhecidas e alunos questionaram minha opinião acerca das pesquisas de intenção de voto e os resultados que não batiam entre os diferentes institutos e, pior de tudo, não correspondiam aos resultados observados nas urnas. O que teria ocorrido?
Como sempre existem diferentes maneiras de responder a essa pergunta. Inicialmente pode-se buscar o problema em questões mais técnicas, mais especificamente em aspectos relacionados à técnica de amostragem e coleta de dados. Em excelente artigo publicado no jornal Estado de São Paulo por Demétrio Magnoli e intitulado “Os falsários”, o autor acertou na mosca ao expor as mazelas técnicas que afetariam os institutos de pesquisa em geral, disse Demétrio:

“Todos os grandes institutos brasileiros cometem um mesmo erro metodológico, bem conhecido pelos especialistas. Eles usam o sistema de amostragem por cotas, que tenta produzir uma miniatura do universo pesquisado. A amostra é montada com base em variáveis como sexo, idade, escolaridade e renda. Isso significa que a escolha dos indivíduos da amostra não é aleatória, oscilando ao sabor de variáveis arbitrárias e contrariando os princípios teóricos da amostragem estatística. [...] A amostragem por cotas não permite calcular a margem de erro. Os institutos "resolvem" a dificuldade chutando uma margem de erro, que exibem como fruto de cálculo rigoroso”.

Além de questões metodológicas existem problemas bem mais sérios que afetam institutos e profissionais de pesquisa que surgem quando estes agem como se fossem extensões de partidos políticos e grupos de interesse, procurado usar da pesquisa para emprestar aparência “científica” e respeitabilidade para sua agenda de compromissos políticos que nada têm em comum com a prática séria da pesquisa

Como disse Demétrio Magnoli pesquisas não decidem eleições, mas podem impactar de maneira significativa nos resultados das urnas. Basta pensar que muitas pessoas decidem seu voto escolhendo aquele candidato que aparenta ter mais chances de ganhar. Sim isto existe, embora ainda não seja um fenômeno muito bem conhecido nem quantificado. O fenômeno leva o nome de “comportamento de manada”(1), que pode ser facilmente observado nas decisões de investidores de mercados de ações em situações de crises e até de boatos. Nestas circunstâncias, muitos e inexperientes investidores tendem a agir de maneira a seguir a tendência dominante – se a ordem é vender, eles vendem, se todos estão comprando, eles também compram. Tal padrão de comportamento tem raízes em elementos irracionais – medos e ansiedades – que afetam a percepção, a tomada de decisões, bem como as ações.

Assim, a mistura de pesquisa com agenda política não é apenas indigesta por ludibriar o público - o que é muito grave - mas é também terrível nas consequências que terá para o mercado de pesquisa no longo prazo em razão da corrosão da sua credibilidade.

Para quem tiver interesse em ler o artigo do Demétrio Magnoli clique aqui


(1) Comportamento de manada é o nome que alguns estudiosos da economia comportamental dão à tendência de indivíduos mimetizarem a ação e as escolhas – racionais ou irracionais – de grandes grupos nos quais se sentem inseridos.

Nenhum comentário: