terça-feira, 26 de setembro de 2017

Modismos Tradicionais

Se você abrir uma revista de moda agora vai encontrar editoriais falando sobre as tendências e costumes para o outono/inverno 2017 – um "revival" dos anos 80 com suas calças de cintura alta, casacos e camisas largas, muitos acessórios dourados, cabelos desfiados. Tudo indica que a proposta da indústria do vestuário é que a estação seja marcada pelo retorno ou, como preferem os especialistas da área, por uma releitura dessa época. Isso porque a moda está sempre recorrendo ao passado para se reinventar e, ao que parece, essa estratégia tem funcionado muito bem para fazer girar a roda do consumo.

O que estamos observando são reedições ou releituras de padrões estéticos do passado seja no vestuário, mobiliário, veículos, utensílios domésticos e um sem número de produtos usufruídos no cotidiano. Assistimos a conciliação entre a inovação e a tradição. Em outras palavras, podemos dizer que estamos agregando recursos tecnológicos mais avançados para incrementar a fruição de velhos hábitos.

"Vivemos em ciclos, reedições: grande parte dos lançamentos do cinema em 2017 são filmes baseados nos heróis das décadas de 40, 50 e 60 do século XX - Mulher Maravilha, Homem Aranha, Liga da Justiça, A Bela e a fera..."
Exemplos são inúmeros no nosso cotidiano, mas tomo como referência desse fenômeno o consumo de café no Brasil. O hábito de beber café, que é uma tradição em nossa sociedade, vem agregando complexidade e sofisticação em seu processo de consumo.

Beber café nunca esteve tão na moda como agora. Em casa ou nas cafeterias, os cafés não são mais coados simplesmente, mas preparados em cafeteiras high tech que controlam a temperatura da água, moem na medida certa grãos diferenciados – as mais variadas espécies dos chamados "cafés gourmets". Os baristas, profissionais especialistas no preparo da bebida, nos servem em xícaras bem feitas em design e materiais especiais para conservar a temperatura do café. O que estamos fazendo é resgatar com novos recursos tecnológicos um ritual que começou com os árabes nas primeiras cafeterias de Meca – os Kaveh Kanes - pontos de encontro luxuosos e agradáveis onde se podia usufruir da companhia de amigos, fazer negócios, ouvir música e beber café.

Como explicar o resgate de referências estéticas e de conduta do passado para atualizar hábitos de consumo?

Gilles Lipovetsky, sociólogo francês que estuda o fenômeno da moda e suas manifestações, acredita que as sociedades ocidentais passaram a cultuar as novidades em detrimento das tradições venerando a mudança e valorizando tudo o que é presente. Para ele as tradições no passado eram adotadas por obrigação, para manter um sentido de coletividade e unidade de valores. No período atual, Pós-Moderno segundo o autor, o individual prevaleceria sobre o coletivo. Não haveria mais a necessidade de se perpetuar costumes, pois teríamos conquistado a liberdade para decidir o que desejamos ser, fazer e querer. Assim, o passado nos serviria apenas como uma referência para novas condutas.

Particularmente acredito mais na força e na permanência das tradições e rituais sociais do que no imperativo das novidades. Talvez o momento atual possa estar orientado para um aparente desprendimento do que é tradicional, mas compartilho da visão de Gabriel de Tarde, outro sociólogo francês, para quem o elemento tradicional seria sempre preponderante aos ímpetos da moda e das inovações.

Talvez por isso persista o hábito de beber café como faziam os árabes, mas agora com xícaras com design mais elaborado, as confrarias de vinhos abertos agora com saca-rolhas movidos a pilhas. Talvez por isso sobrevive e, mais ainda, cresce a demanda pelos casamentos com direito a vestidos brancos e toda a parafernália ritual. O que a moda nos sugere são formas passageiras e leves de usufruir uma tradição, mas as novidades não têm força para se sobrepor aos conteúdos tradicionais. Por isso, os modismos tendem a ser frágeis e efêmeros, enquanto os costumes têm uma natureza mais permanente.

Quando resgatamos antigos hábitos de consumo e repaginamos as tradições com os ares da inovação o fazemos numa tentativa de preservar um eixo, algo que nos sirva de referência e nos permita preservar criativamente nossa identidade cultural.

Coisas que eu aprendi sobre Brand Advocacy comendo rabanadas

Quem é brasileiro conhece bem esse doce de origem portuguesa que ainda é vendido em algumas padarias por ai.
Para quem não conhece, o descrevo como uma espécie de prima-irmã das “french toasts” que os americanos preparam, aquela delícia feita com pães dormidos, ovos, leite, açúcar e canela.

Uma de minhas avós era mestra na confecção desse doce natalino e nos presenteava com uma bandeja tão grande, mais tão grande, que parecia uma maquete do Monte Everest. As outras mulheres da família, por mais que tentassem, não conseguiam fazer nada parecido. Eu e meus primos comíamos até ficarmos completamente saciados e, então, ficávamos todos deitados no chão rindo à toa de tanta felicidade enquanto ouvíamos as histórias mais fantásticas que a Vó contava. E, assim, passava mais um Natal.

Quando chegava o mês de abril ou maio nós começávamos a sentir um desejo incontrolável por rabanadas e, adivinha... Corríamos para o colo da avó para pedir as delícias e ela dizia:

- “Vocês podem pedir qualquer coisa, pipoca doce, pudim, qualquer bolo que eu faço, mas rabanada é só no Natal !”

A gente saia da sala com uma cara de derrota e desapontamento e não conseguíamos entender por que, afinal das contas, a Vó não queria fazer rabanada. Cada um de nós tinha suas teorias sobre a recusa. Uma prima dizia que o pão era especial e era feito no Natal, outro primo achava que era porque o papai Noel trazia os ingredientes. Enfim, a gente tentava encontrar uma explicação lógica.

O fato é que a minha avó nunca fez uma rabanadinha que fosse fora da época de Natal. E nós, ficávamos aguardando ansiosamente pelo próximo Monte Everest de rabanadas. Pois é, ela conseguiu fazer de suas rabanadas um "produto premium", altamente desejado e oferecido com experiência agregada. Ela, definitivamente, conseguiu conquistar um grupo de seguidores fiéis.

Num momento em que conhecer a Jornada do Consumidor é um dos desafios para as empresas, essa história familiar nos oferece alguns elementos que podem ser úteis para nos ajudar a entender o quê fazer para transformar consumidores em "Brand Advocate":


  • Faça o que você sabe fazer bem, o que está no espectro das suas competências. Não queira vender algo só porque está na moda. Invista em trazer para o seu consumidor algo que você testou inúmeras vezes para obter excelência. Ofereça o que você tem de melhor para entregar e, acredite, as pessoas têm capacidade para perceber que o produto ou serviço que está sendo entregue é algo baseado num ciclo de aprendizados que sua marca desenvolveu até alcançar aos resultados que chegou. Seu consumidor tem condições de efetuar comparações entre seu produto e os dos concorrentes para orientar e definir suas escolhas.
  • Crie um produto diferenciado e agregue o máximo de valor. Invista seus esforços para criar um produto único, que ninguém conseguia copiar, não importa se você está usando “ingredientes” simples ou extremamente complexos, ofereça algo que o seu consumidor não encontra em outros lugares com facilidade. Ou, mesmo que ele encontre similares, deseje repetir a experiência com a sua marca porque ele entende que há algo de valor significativo além daqueles tangíveis do produto, ou seja, um "algo a mais" que ele recebeu e resultou numa conexão emocional com sua marca.
  • Proporcione uma experiência de consumo completa e única. Entregue ao seu consumidor um produto de primeira qualidade, mas, sobretudo, faça com que ele tenha uma experiência abrangente e intensa e que ele possa se sentir acolhido e exclusivo, desde o momento em que parte para a busca de informações sobre sua marca, até o momento em que termina a sua jornada. Se sua marca estiver presente numa loja física permita que seu consumidor usufrua do produto num ambiente interessante, acolhedor. Esteja disposto a interagir, coloque-se à disposição, mas sem forçar o contato. Se a relação se dá no ambiente virtual, torne o contato o mais próximo possível do “um a um”, tente simular o máximo possível essa acolhida que nós estamos acostumados a fazer melhor no mundo real. Faça com que ele saia da experiência de consumo querendo repeti-la, e que ele sinta o impulso de sair contando essa boa história para sua rede de contatos.

Com tudo isso realizado, ai sim, você pode dizer que está construindo uma marca que tem grandes chances de ser recomendada pelos seus clientes.