quarta-feira, 29 de abril de 2009

Crise financeira e o surgimento de um novo consumidor – O simplificador

A crise financeira que começou a ganhar dimensões críticas a partir de setembro de 2008 está alterando de modo radical o ambiente dos negócios em praticamente todo o mundo. Com a rápida difusão da crise através de suas ramificações sistêmicas, tudo indica que as alterações nos mercados e no comportamento dos consumidores será profunda e durável. Em períodos de recessão econômica os consumidores tendem a adotar padrões mais conservadores de consumo, evitar excessos de auto-indulgência, além de utilizar critérios mais racionais de compras. Contudo, em crises mais profundas, cujos efeitos se prolongam por períodos de meses ou anos, a tendência é das mudanças no comportamento de consumo assumirem um caráter mais duradouro.

Baseado nessa premissa o professor John Quelch da Harvard Businness School propôs que em razão das alterações no cenário econômico as mudanças de comportamento levariam as pessoas a adotar um novo padrão de consumo que ele denominou de "Simplificadores" (Simplifiers em inglês), que inicialmente se expandiria nas classes mais altas – média alta e alta - e, posteriormente, tenderia a se difundir rapidamente pela sociedade. As 4 características mais salientes desse novo perfil que Quelch descreve seriam:

  • Consciência de que possuem muito mais objetos do que de fato necessitam;
  • Percepção de que o excesso de bens pode ser embaraçoso e, pior ainda, na medida em que a posse de bens categorizados como "de luxo" difundiu-se pela sociedade, os objetos perderam a capacidade de agregar status social (1);
  • Desejar e valorizar mais as experiências do que o simples acúmulo de bens e objetos;
  • Viver bem seria viajar para lugares exóticos (nada de pacote turístico), jantar em restaurantes charmosos de culinária sofisticada, mas nada ostensivos e praticar esportes diferentes. Enfim, fugir do estilo "enricado"(2), muito comum no Brasil de hoje.

O perfil "simplificador" seria oposto ao padrão que caracterizou o consumo da década de 1990 - 2000. Daí a tendência a rejeitar o consumo rotulado como "de luxo" e do que se entende por "estilo de vida dos ricos" – i.e. casas grandes, com muitos cômodos recheados de utensílios domésticos, TVs LCD acima de 50 polegadas, carros do tipo sport utility com motores V6 e V8 e grifes, muitas grifes.

Segundo o professor de Harvard, o estilo "simplificador" deve se desenvolver nos países mais desenvolvidos, que já teriam atingido um certo estágio de desenvolvimento econômico e cultural. Já os países em desenvolvimento seriam o destino alternativo para os fabricantes dos bens e objetos que não teriam mais tanto apelo nos países ricos. Curioso notar como as montadoras estão investindo no Brasil e trazendo para cá modelos que antes chegavam apenas como "importados" e a um preço elevado. Mesmo assim, acredito ser difícil generalizar, uma vez que há já alguns anos segmentos da elite local vem se afastando do consumo de bens ostensivamente de luxo. O crescimento do consumo desses itens estaria se dando em segmentos da classe média alta e entre aqueles agraciados com fortunas recentes.

Para ler o artigo do prof. Quelch na íntegra clique aqui

(1) A elite, desempenhando seu papel de centro emissor de costumes, abandona hábitos que ela mesma ajudou a criar a partir do momento em que esses hábitos tornam-se acessíveis às massas e não oferecem mais diferenciação social nem cultural.

(2) "Enricado" - Neologismo produzido a partir da corruptela do termo enriquecido, de uso comum nas classes mais baixas do Brasil e no discurso de alguns políticos em evidência.

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