quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Consumidor infantil. De quem estamos falando?

Há algum tempo venho observando a propagação de estereótipos do que seria ser criança, especialmente quando o tema é comportamento de consumo.

Tem se tornado recorrente tanto nos estudos de mercado como nos acadêmicos apresentar um retrato das crianças como voluntariosas e manipuladoras que saberiam muito bem o que querem e fariam de tudo para obter o que desejam. Por serem reféns da TV - assistiriam uma programação variada em torno de 4 horas por dia – estariam constantemente à mercê dos inúmeros apelos publicitários, reagindo sem crítica, sem limites ou parâmetros aos anúncios de brinquedos, guloseimas e afins. E para atingir seus objetivos desenvolveriam estratégias várias para manobrar os adultos a comprar compulsivamente o que desejam. O poder de influência das crianças tem sido identificado inclusive no consumo familiar. Diferentes estudos de mercado apresentam resultados que indicam que crianças podem influir em até 80% dos produtos consumidos no domicílio.

Outro aspecto do comportamento infantil que tem sido bastante enfatizado é o ingresso cada vez mais rápido na vida adulta, queimando etapas no desenvolvimento e demandando o consumo de produtos e serviços até bem pouco tempo destinados aos adultos – roupas de grife, maquiagem, serviços de estética, cirurgias plásticas etc.

Ainda mais, as crianças hoje seriam ávidas por tecnologia, preferindo longas horas na companhia de jogos eletrônicos do que atividades físicas ou brincadeiras em grupo ou ao ar livre. Além de não trocarem um Big Mac por um prato de comida caseira ou mais saudável.

Em minha experiência como pesquisadora tenho me deparado com crianças com perfis e interesses bem diferentes dos descritos acima e que não caberiam exatamente nesses estereótipos que acredito não representarem a totalidade de crianças consumidoras, mas apenas uma parcela para os quais os esforços de publicidade e marketing parecem estar mais fortemente direcionados. Resta saber por que o interesse em reproduzir e reforçar tais estereótipos e deixar em segundo plano ou mesmo não apresentar outros perfis de consumidores infantis.

O que tenho notado é que no mesmo ambiente social convivem crianças que correspondem aos estereótipos acima com outras tantas que aprenderam a conciliar o interesse pela tecnologia e a mídia com uma vida mais simples. Jogam Nintendo Wii, mas não dispensam um passeio com o cachorro ou a leitura de um livro. Dão valor à companhia de amigos, gostam de passear ao ar livre, ouvir histórias e conversar. Não abominam a companhia de adultos e nem querem imitá-los, gostam de se saber crianças e não parecem querer queimar etapas para se tornarem adultos antes do tempo. Sabem ouvir um "não" e aceitam quando lhes impõem limites para consumir exageradamente. Gostam de cozinhar, fazer biscoitos não porque são obrigados pelos adultos, mas simplesmente porque querem, porque aprenderam a gostar desse exercício lúdico.

Acho que ainda tem um pouco de Sítio do Pica-Pau Amarelo na alma dessas crianças. Mas pouco se diz sobre elas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito interessante teu post, estou procurando mais informações sobre consumidor infantil, pode me recomendar alguma coisa?

Obrigado!

Luiz Stevanato disse...

Oi Julei,
Existem muitos livros sobre comportamento infantil em inglês. Considero básicos: "Kids as Customers - A handbook of marketing to children - James U. McNeal" e "Marketing to and through Kids - Selina S. Guber e Jon Berry"
Em português:"A criança no discurso do outro - Jussara Falek Brauer"